Metabolismo do Estresse: Impactos na Saúde e na produção animal

 Hoje começo uma série de postagens sobre algumas leituras teóricas importantes. O primeiro é Metabolismo do Estresse: Impactos na Saúde e na produção animal, Seminário apresentado por ELISANDRO OLIVEIRA DOS SANTOS, na disciplina Bioquímica do Tecido Animal no Programa de Pós-Graduação em Ciências Veterinárias da Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Maio de 2005. Professor da Disciplina: Félix H. D. González.

Se o stress causa problemas nos seres humanos, é de se esperar que eles também tenham um impacto na saúde fisiológica e mental dos animais. As alterações causadas pelo stress provocam uma “quebra do equilíbrio orgânico, em outras palavras da homeostasia, e a capacidade adaptativa sobre estas alterações é chamada de metabolismo do estresse. O estresse visto de uma forma mais clara:  “é uma resposta fisiológica do organismo provocado pela alteração da homeostasia, que busca fornecer ao corpo subsídios para responder e adaptar-se a estas alterações.” (SANTOS, 2005, p.1)

O prolongamento do stress causará vários transtornos no organismo, resultando em alterações produtivas, reprodutivas, comportamentais e psíquicas. Segundo o autor é importantíssimo compreender o metabolismo do estresse e a resposta dos animais a esta influência para que tais problemas descritos acima possam ser minimizados ou evitados, em se tratando de animais silvestres ou domésticos.

Há vários agentes estressores como o frio/calor, fome, dor, ansiedade, medo, que provocarão um estímulo nervoso que ao chegar ao cérebro, mais precisamente no hipotálamo, provocará a liberação de vários hormônios causando várias alterações metabólicas. O autor divide o mecanismo do estresse em três etapas:

1ª fase – Alarme
É subdividida em Fase de choque e contra choque. Na fase de choque ocorre o desencadeamento provocado pelo agente estressor que irá ativar o eixo HHA, com a participação também do sistema nervoso autônomo, ativando as respostas físicas, mentais e psicológicas ao estresse.
2ª fase – Resistência
Atuação predominante da adrenal ocorrendo uma atuação máxima de glicocorticóidese catecolaminas. Estes atuam ativando a glicogenólise no líquido extra-celular e a glicogênese e gliconeogênese no fígado, inibindo a insulina e estimulando o glucagon. Isto permite um maior aporte de glicose para todo o organismo, principalmente para as células cerebrais e musculares. Os glicocorticoides atuam também controlando as catecolaminas, que necessitam de glicose para sua síntese.
3 ª fase - Esgotamento
Continuando o agente estressor o organismo passa para a fase do esgotamento, onde começam a falhar os mecanismos adaptativos e inicia-se um déficit energético, pois as reservas corporais estão esgotadas.
c.f. Santos 2005

Os hormônios do estresse causam alterações na função reprodutiva, (no texto são dados detalhes sobre quais são os hormônios afetados) e portanto este é um fator que pode impedir a reprodução de algumas espécies em cativeiro. O texto cita vários exemplos de animais que sofrem com agentes estressores dos mais variados, e como sofrem alterações comportamentais, fisiológicas que podem até mesmo levar ao óbito, e infertilidade.

O cativeiro é um agente estressor muito grande. A síndrome de má adaptação, que atinge algumas espécies em cativeiro, causa um processo de anorexia que pode levar à morte. O excesso de sons em zoológicos pode dificultar a função reprodutiva de algumas espécies, sendo citado o caso do panda gigante.

O transporte para transferência de recintos em zoológicos é outro fator estressante para animais, como por exemplo nos tigres (Panthera tigres), aumentando seus níveis de cortisol e seu comportamento. Nos elefantes aparecem comportamentos repetitivos como o balançar constante de cabeça. Na vida selvagem foram encontrados indícios de estresse nas fezes de aves migratórias, através da dosagem de corticoides. A hierarquia social e a manutenção de dominância também são fatores geradores de estresse em animais de vida livre, como nos lobos (Canis lupus), onde “altos níveis de cortisol foram associados com animais dominantes, sendo de alto custo para a espécie manter dominância, devido ao estresse crônico” (SANTOS, 2005, p.5)
Uma solução para este problema de acordo com o autor é o enriquecimento ambiental, que aumenta o bem estar dos animais e as suas taxas reprodutivas.

“Segundo SHEPHERDSON (1998), o enriquecimento ambiental é um princípio no manejo
animal que procura ampliar a qualidade de vida dos animais em cativeiro através da
identificação e fornecimento de estímulos ambientais necessários para alcançar o bem-estar
psíquico e fisiológico, estimulando comportamentos típicos da espécie, reduzindo estresse e
tornando o ambiente cativo mais complexo e diverso
” (SANTOS, 2005, p.5)

Os benefícios do uso do enriquecimento ambiental são: a redução do estresse, a diminuição de distúrbios comportamentais, a redução de intervenções clínicas, a diminuição da mortalidade e o aumento de taxas reprodutivas.

Extrapolando o texto, gostaria de compartilhar com vocês uma reflexão que fiz ao terminar a leitura do artigo de Santos sobre o estresse. Lembrei-me de quando em 2008 fiz a disciplina isolada “A biologia do Conhecer na Experiência em sala de aula.” no mestrado de Linguística aplicada ao ensino de línguas, na UFMG com a Dra. Laura Miccoli e tive o prazer de conhecer e estudar o autor Humberto Maturana.  

Para quem não o conhece coloco aqui uma pequena descrição deste brilhante filósofo, biólogo e estudioso, e sugiro a leitura da entrevista da qual foi retirada esta citação:

“Humberto Romesín Maturana é Ph.D. em Biologia (Harvard, 1958). Nasceu no Chile, estudou Medicina (Universidade do Chile) e depois Biologia na Inglaterra e Estados Unidos. Como biólogo, seu interesse se orienta para a compreensão do ser vivo e do funcionamento do sistema nervoso, e também para a extensão dessa compreensão ao âmbito social humano. É professor do Departamento de Biologia da Faculdade de Ciências da Universidade do Chile. Prega a Biologia do Amar e do Conhecer para a formação humana. Sustenta que a linguagem se fundamenta nas emoções e é a base para a convivência humana. Fundou, em Santiago, o Instituto de Formação Matríztica, um espaço relacional que favorece a ampliação da compreensão de todos os domínios de existência humana, desenvolvendo estudos sobre a Biologia do Amar e do Conhecer, por meio de cursos, palestras e oficinas de conversações operacionais e reflexivas sobre a Matriz Biológica da Existência Humana.”

Dizem que não se pode fugir do seu destino, vejam que já em 2008 eu me via às voltas com a biologia, e confesso que não foram leituras fáceis para nenhum de nós linguistas, especialistas ou mestrandos, que nos aventuramos no pensamento incrível de Maturana. Apesar de que nosso foco era no papel impactante das emoções no processo de ensino/aprendizagem, lemos algumas de suas obras que explicam o que é a sua teoria da autopoiese e a biologia do conhecer. Os livros estudados foram A ontologia da realidade; Emoções e linguagem na educação e na política; e Cognição, ciência e vida cotidiana.

Na obra Cognição, ciência e vida cotidiana Maturana demonstra a importância das emoções, e como nossas ações são resultantes do nosso estado emocional. O exemplo da barata me veio à mente ao ler o texto Metabolismo do Estresse, e compartilho-a com vocês:

Se vocês chegam em casa à noite no verão, acendem a luz, e ali no meio da cozinha há uma bela barata caminhando tranqüilamente, vêem a barata e dão um grito. A barata começa a correr desesperadamente de um lado para o outro. A barata mudou o domínio de ação. Essa barata que corre de um lado para o outro, se lhe oferecem comida, não pode comer. Não pode copular; há certas coisas que não pode fazer. Mas a barata que se move tranqüilamente no meio da cozinha, se encontra uma comidinha, pode comer. Essa transição de um domínio de ação para outro é uma transição emocional. As emoções surgem no momento em que eu atento para a operação de distinção sob a qual eu falo de emoções. Então as emoções surgem como disposições corporais que especificam domínios de ação. E isso é compreensível biológicamente. As emoções são apreciações do observador sobre a dinâmica corporal do outro que especifica um domínio de ação. Nessas circunstâncias, nada ocorre nos animais que não esteja fundado numa emoção.” (MATURANA, 2006, p.46)

Creio que este trecho acima de Maturana fecha bem a compreensão do texto de Santos sobre o estresse. Não podemos esperar que um animal, seja silvestre ou doméstico, tenha uma vida normal e que seu metabolismo e comportamento sejam adequados à sua espécie se eles estão sob o domínio de um ou mais fatores estressantes. Antes de combater os sintomas é necessário combater as causas desse estresse.

A vida em cativeiro é um dos maiores fatores estressantes a qualquer animal silvestre, e por isso que nós, aprendizes e iniciantes na nobre arte da falcoaria, temos uma enorme responsabilidade sobre o bem estar de nossa futura ave. Por isso defendo antes de tudo muito estudo e a orientação de falcoeiros experientes, para só depois, e talvez bem depois, adquirir a sua primeira ave, cuja escolha da espécie deve ser bem analisada e não motivada apenas pela emoção, mas pela união da emoção com a razão. Desta maneira tanto o falcoeiro como a ave terão uma convivência diária saudável, baseada no respeito e na ética.

Como diz Maturana: "Todo hacer es conocer y todo conocer es hacer."
Então vamos estudar!

Abraços,
Kátia Boroni

Referências:
SANTOS, Elisandro Oliveira dos. Metabolismo do Estresse: Impactos na Saúde e na produção animal. Seminário apresentado na disciplina Bioquímica do Tecido Animal no Programa de Pós-Graduação em Ciências Veterinárias da Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Maio de 2005. Professor da Disciplina: Félix H. D. González.

MATURANA, Humberto. Coginição, Ciência e Vida Cotidiana. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2006.





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